Aikido na Zona Leste de São Paulo

No início da década de 1990 a zona Leste de São Paulo ainda não tinha um dojo de Aikido e qualquer pessoa que quisesse treinar precisava se deslocar para aqueles bairros com colônias japonesas, principalmente para a zona Sul. Por isso o Sensei Makoto Nishida, a convite de alunos de sua academia (ACAM) que também praticavam Karatê e possuíam um dojo com amplo tatame no bairro do Tatuapé, resolve expandir a oportunidade de treinos na região. Antes mesmo de iniciar as aulas e vendo-se impossibilitado pela falta de tempo e pela distância passa a incumbência de dar aulas a outro aluno, Maurício Pereira Francischelli, que em Janeiro de 1992 inicia as aulas de aikido na Academia Resistência sob a supervisão do Sensei Nishida.

E em 2011 o Sensei Francischelli inicia o Blog Higashi Aikido para compartilhar suas experiências em artes marciais.

segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Minha monografia sobre o Aikido

Minha visão do Aikido

Descreverei sobre a influência da prática do Aikido em minha vida levando em consideração 21 anos de prática desta arte marcial. Destes, 18 anos foram como instrutor, tendo hoje vários de meus alunos portando a faixa preta e alguns destes hoje atuando como professores.

Estive por duas vezes no Japão. Na primeira, em 1996, como companhia de meu mestre, Sensei Nishida, e mais três amigos do Aikido. Quando visitamos vários Dojos. Entre eles os Dojos do Senseis Kawabe em Akita, Saito Sensei em Iwama e Hombu Dojo em Tóquio. Esta viagem não apenas me despertou mais a vontade de conhecer os estilos próprios dos mestres japoneses, mas também um maior interesse na cultura Nipônica em geral. Na segunda, em 2000, fui a trabalho, me estabelecendo lá por pouco mais de um ano. Neste período, treinei regularmente no Hombu Dojo, e também no pequeno Dojo do Sensei Takao Saito, no bairro de Ikebukuro.

Devo confessar que o real motivo de ter aceitado trabalhar no Japão foi a oportunidade de vivenciar o ambiente em que o Aikido nascera e se desenvolvera. Para mim era uma oportunidade única de ter uma experiência deste gênero. Ali pude entender o que para mim é um dos aspectos mais importantes do Aikido – o desenvolvimento da sensibilidade, ou seja: a ligação que ocorre entre os elementos constitutivos de sua prática (o parceiro, a força, o relaxamento, o Ki etc...). E pela compreensão advinda do sentido imediato da união destes elementos fundamentais da prática, pude entender melhor a ênfase de O-Sensei Ueshiba em fazer do Aikido, além da prática, um instrumento de união das pessoas entre si e o universo.
Procurei entender o Aikido como o japonês o entende. Entrar na atmosfera originária e compartilhar do mesmo sentimento e, no que me diz respeito, foi muito gratificante e compensador.

Pelo fato de ter trabalhado em uma empresa Nipo-Brasileira, a grande maioria dos colegas eram brasileiros. Assim, o real contato com os japoneses nativos se deu com os colegas do Aikido, principalmente os do Dojo do Saito Sensei. Ali descobri que a linguagem do Aikido é universal; bastando apenas que sejamos flexíveis para compreender as várias nuanças que ocorrem na forma e no sentimento do Aikido que, como disse, pode ser compartilhado por todas as pessoas indistintamente.

Foi por meio do Saito Sensei que tive o maior contato com as raízes do Aikido, pois ele fora aluno direto do fundador e, após sua morte, passou a estudar com o Dosho Kisshumaro Ueshiba. O treino do Saito Sensei era baseado principalmente em três Katas: Daí it kyu ura, Irimi nague e Shiho nague. E o aspecto mais importante era o uso do Kokyuho. Nos nossos treinos, pouco se falava de técnica ou uso de alavancas. Tudo tinha que acontecer por meio de relaxamento, respiração, postura e concentração.

Com a vida mais calma e introspectiva do Japão, e por influência do Aikido, passei a me dedicar mais à meditação e usufruir de seus benefícios para a própria prática do Aikido, na vida cotidiana e no trabalho.

Observando melhor hoje os efeitos da meditação, posso notar como o Aikido harmoniza a mente e o corpo. Em vista disso, o horário de minha aula no Dojo do Tatuapé é à noite, logo após o trabalho, para o qual geralmente levo de 15 a 30 minutos indo de moto. Dependendo da pressa para ir do escritório em que trabalho no centro de São Paulo para o Dojo, e muitas vezes sem o tempo necessário para chegar a tempo para iniciar a aula, passei a notar que, nestas condições, após o início da aula, é muito difícil manter a concentração e livrar a mente da agitação do dia. Porém, na meditação que fazemos no final da aula, pude perceber o quanto o Aikido nos ajuda a restabelecer a calma e a tranqüilidade, tanto que precisamos apenas de alguns segundos de Zazem ao final da aula para chegar a esta constatação.

Para ilustrar, gostaria de citar aqui, de memória(???), uma fala do Sensei Nishida como exemplo para o que quero dizer e que me parece esclarecer bem: “A mente tranqüila é como um lago de água parada. Mesmo estando de um lado do lago, conseguimos perceber se uma pedra cai no outro lado do lago. Em contra partida, no mesmo lago, se as águas tiverem turbulentas, não perceberíamos qualquer queda, mesmo se fosse uma rocha que caísse nas águas.” Através da meditação é possível notar o quanto o Aikido é benéfico. A tranqüilidade e, conseqüentemente, o aumento da percepção são apenas uns dos fatores colaborativos do Aikido em minha vida.

Estratificando o Aikido

Assim, costumo explicar para as pessoas que vêm conhecer o Aikido no meu Dojo, que este, como arte marcial, tem várias funções, entre elas estão:

Defesa pessoal – O maior diferencial entre o Aikido e as outras artes marciais é que o fundador Morihei Ueshiba desenvolveu uma forma de defesa onde não é empregada a agressividade. O praticante de Aikido deve usar as técnicas limitando-se a imobilizar ou reduzir a capacidade de ação do agressor sem machucá-lo, sem o desmoralizar e sem tirar-lhe a vida. A melhor técnica de defesa do Aikido é o desenvolvimento da capacidade de resolver problemas, sem o uso da agressividade e não se envolver em conflitos.

Expressão corporal – A arte é elemento fundamental para o ser humano, ou melhor, a arte é o que torna o ser humano humano, pois ela é a expressão de suas aflições e desejos mais profundos. Os movimentos do Aikido não são apenas efetivos marcialmente, foram elaborados para serem agradáveis e belos, possuem regras. O ser humano é capacitado para a prática do Aikido por possuir as ferramentas físicas necessárias: braços e pernas; e mecanismos emocionais como: uma mente sensível, noção de justiça e beleza. Nas aulas sempre comparo o caminho do Aikido com o aprendizado de arte: o iniciante aprende a base, a forma e a utilização dos instrumentos. Na fase intermediária, estuda o aprimoramento da técnica. E é na fase mais avançada que acontece o momento criativo, onde o praticante faz uso da técnica e da forma inconscientemente, tendo em mente apenas o objetivo de comunicar seus sentimentos, é o momento da desconstrução da técnica em busca do “essencial”.

Condicionamento físico – Por meio da incansável busca do aprimoramento do Aikido, ocorre a melhora da forma física do praticante. Com a prática regular, o corpo fica mais forte, flexível e resistente, passa a agir em harmonia com a mente.

Espirutualidade – Sabemos através da história que o O-Sensei buscou juntamente com o Budo um caminho de espiritualidade e purificação, podemos dizer que o Aikido é a sintese desta sua busca.

No Aikido, estamos diante de um templo e quando iniciamos a aula pedimos a proteção e iluminação Divina, cada um a sua forma. Pessoalmente, enxergo muito do Cristianismo no Aikido: pregamos a paz, a não violência e só progredimos no Aikido por meio da colaboração do próximo.

Elemento socializador e educacional – Sabemos do empenho e ênfase do O-Sensei – seguido pelos Doshos – em esclarecer que o Aikido não deveria se tornar um esporte de competição, como aconteceu com outras artes marciais que se viram sem opção de continuidade após as intervenções ocorridas a partir da Restauração Menji em 1868, quando se inicia a modernidade no Japão. Ouvimos do fundador, palavras de alguém que passou por momentos terríveis e catastróficos, e que esclarecem sua compreensão de uma nova realidade, como ele mesmo diz, “mais soft” pela qual o mundo inteiro, hoje, de modo cambaleante e indeciso anseia. Uma realidade em que cada vez mais se percebe que é possível direcionar o que antes era destrutivo para aspectos mais construtivos.

Todavia, sabemos que as nossas sociedades atuais, individualistas e capitalistas, permanecem apostando em falsos valores da “competição” e do “individualismo” que têm demonstrado claramente hoje, a quem quiser ver, os seus estragos. Sociedade em que prevalece o lema popular, baseado no antigo modelo do uso da força bruta, do “quem pode mais chora menos”. E é em meio a esta realidade, creio eu, que o Aikido – permanecendo sem ceder ao domínio da competição e dos campeonatos – pode inspirar, uma pedagogia da pacificação e da cooperação, da solidariedade e amor ao próximo, de uma autoridade fundada no respeito e não no arbitrário, contra o individualismo e a competição. Vemos assim que, também no campo pedagógico e social mais amplos, o Aikido tem muito a contribuir.
Conclusão

Particularmente, como professor, a experiência mais gratificante é passar adiante os benefícios do Aikido e poder ver a melhora que ele proporciona aos alunos.

Espero com esta minha fala ter motivado as pessoas a praticarem artes, a expressar seus sentimentos, e tornarem-se mais humanas. E seria muito bom se esta arte proporcionasse mais saúde, e menos vulnerabilidade aos problemas cotidianos.

São Paulo - 27/11/2011
Mauricio Francischelli Sensei

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Sensei Francischelli

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Professor de Aikido desde 1992 no Bairro do Tatuapé em São Paulo e designer gráfico. O Dojo Francischelli Fica na rua Santa Maria, 471, Tatuapé. Cel.: 7953-6864

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